Telas inventadas, pinturas da mente.
agosto 14, 2014
Bia
setembro 15, 2017
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Festa anticonformista, Galeria Oscar Cruz,2012

Ambiguidade é o nome do jogo aqui.O artista Éder Roolt carrega nas tintas para pôr em xeque noções culturais de real e realismo,de reprodução e identidade,de padrão e desvio. Bebendo na fonte do hiper-realismo,do qual ao mesmo tempo desconfia profundamente,Roolt cria uma linguagem própria de pintura figurativa – que passa então a distorcer e tencionar conforme a necessidade do tema abordado ou da iconografia eleita.

De instantâneos de uma infância inocentemente despudorada a uma adulteração da candura,passando por indícios do inconsciente -o brinquedo,a memória indireta da fotografia,o símbolo do fim de festa-,as pinturas do artista escancaram as maiores perdas do mundo real.A infância,na obra de Roolt,não é um tema localizado,mas antes um recurso metafórico para retratar a subjetividade contemporânea na era da infantilização geral e indiscriminada da maturidade,e também o seu reverso,a precocidade e queima de etapas psicológicas e culturais no universo infantil.

Além disso,a infância funciona,em suas pinturas,como pretexto reconhecível para evidenciar o trânsito entre ficções documentadas e documentos obliterados no imaginário cultural contemporâneo,propondo assim respostas a perguntas como Qual a atualidade e relevância da pintura hiper-realista em tempos de disseminação dos meios de registro e reprodução da fotografia e do vídeo? Faz sentido ainda opor pintura a fotografia nos dias de hoje?

A pintura paulistana vive um boom como não se via desde os anos 1980.Porém,como 30 anos atrás,diante da avassaladora quantidade de obras produzidas pelos pintores,é imenso o desafio de diferenciar o bom do mediano,e mais difícil ainda é distinguir o bom do ótimo.Quais destes pintores que despontaram no final da década de 2000 vão ficar? Que artistas da geração 2010 têm condições de continuar produzindo um trabalho relevante daqui a dez ou 20 anos?

A exposição de Éder RoolT ajuda a separar o joio do trigo no contexto da pintura de seu tempo.Pelo contraste que propiciam em relação a boa parte da produção vigente,suas telas evidenciam o quão complacente e apaziguadora é a pintura praticada nos ateliês paulistanos hoje em dia (porque não se compromete com nada,tem medo de fazer escolhas ou defender o que quer que seja,e acaba esvaziada pela banalidade). Sua pintura,ao contrário,é crítica.Seu discurso é sofisticado.Sua técnica,impecável.E está em boa companhia:Marilyn Minter, Montean & Rosenblum,Eric Fischl,Rudolf Stingel e Dan Colen são alguns dos artistas com quem sua obra dialoga.

Estes são artistas que deixaram no passado o embate entre figuração e fotografia,assim como entre realismo e romantismo, e conferiram,deste modo,outra razão de ser para a pintura de base fotográfica.Um tipo de pintura,aliás,que requer outra designação.”Hiper-realismo”,está claro,não dá mais conta de descrevê-la.Cumpre,diante das telas apresentadas em Festa Anticonformista,perguntar que tipo -ou qual camada- de realidade está em questão,ou mesmo qual o assunto delas,por que são apresentadas nesta e não em outra seqüência,e por que estão reunidas sob este título.

Está tudo aí.Basta olhar com atenção.

Juliana Monachesi

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